terça-feira, 27 de setembro de 2016

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Luxação do Ombro - Ortopimenta

O que é a luxação do ombro?

A luxação, em termos médicos, é definida como a “perda do contato articular”. Isto é, a separação de dois ossos que costumam estar em íntimo e contínuo contato por meio de uma área lisa e deslizante, chamada de cartilagem. Clique aqui para ler mais sobre a anatomia dos ligamentos do ombro. A luxação do ombro ocorre quando uma força extrema supera os mecanismos estabilizadores (lábio, cápsula e manguito) e desloca a cabeça do úmero para fora da glenóide. Chamamos de subluxação quando o úmero retorna à posição original sozinho após o deslocamento. Essas circunstâncias podem ocasionar lesões dos tecidos. Na maioria das vezes, os danos serão no lábio e nos ligamentos. Em pacientes acima dos 40 anos, além do lábio, os tendões do manguito rotador também podem ser lesados, o que torna a luxação mais grave.

O que ocorre após a luxação do ombro?

Após a primeira luxação, o lábio e os ligamentos sofrem algum grau de lesão. Em indivíduos com frouxidão ligamentar, a luxação pode ocorrer mesmo sem uma trauma importante e pode gerar apenas o alongamento dos ligamentos ou lábio, sem lesões mais graves. Na maioria dos outros indivíduos e naqueles com alguma trauma, as luxações geram lesões no lábio e/ou nos ligamentos. Esses tecidos deveriam cicatrizar em uma posição normal para que o paciente não sofresse novos deslocamentos. Infelizmente, essa cicatrização não ocorre na maioria dos casos e, quando ocorre, os tecidos cicatrizam em uma posição anormal. Se não ocorrer a cicatrização, o ombro poderá luxar novamente, gerando a chamada luxação recidivante ou instabilidade glenoumeral.

Com novas luxações, os ligamentos vão se alongar cada vez mais e as lesões podem progredir para o osso. As lesões no osso, chamadas de lesão de Hill-Sachs ou de Bankart ósseo, aumentam ainda mais a chance de uma nova luxação. Mais raramente, pode ocorrer a lesão dos ligamentos no úmero e não na glenóide, conhecida como lesão HAGL (humeral avulsion of glenoumeral ligaments).

Quais são as complicações e consequências da luxação do ombro?

As complicações variam de acordo com a gravidade do trauma, a idade em que ocorreu a primeira lesão, o número de episódios, o tempo em que o ombro permaneceu luxado e se houve ou não lesão de tecidos associados, como o osso e os tendões. Dentre os agravantes, os mais comuns são:

  • Luxação recidivante: novos deslocamentos podem ocorrer com maior facilidade. Em algumas pessoas, a nova luxação acontece apenas durante o esporte. Em outros, pode ocorrer em atividades diárias ou até mesmo dormindo.
  • Lesões ósseas: fraturas ou impacções ósseas, que agravam a instabilidade e o quadro clínico, podem ocorrer nas novas luxações ou mesmo na primeira incidência.
  • Lesão dos tendões do manguito rotador: a luxação pode acarretar lesão nos tendões do manguito rotador, o que limita os movimentos do ombro. Isso ocorre com mais frequência em pacientes acima de 40 anos de idade.
  • Lesões neurológicas: lesões do nervo axilar ou do nervo musculocutâneo podem aparecer, o que vai causar fraqueza e diminuição da sensibilidade de alguns músculos do paciente.
  • Artrose: a recorrência da luxação pode facilitar o desenvolvimento de artrose, isto é, de desgaste articular. Saiba mais sobre a artrose do ombro

Qual é o tratamento da luxação do ombro?

Ocorrido o deslocamento, o objetivo inicial é a redução do ombro – colocar o ombro no lugar. Isso deve ser feito por um médico e apenas após avaliação clínica e radiográfica. Analgésicos, infiltrações ou mesmo anestesia podem ser realizadas para diminuir a dor durante o procedimento. Após a redução, uma nova radiografia deve ser realizada para se certificar de que o procedimento foi realizado de maneira correta. O paciente deve utilizar tipoia. O período de tempo e o tipo de tipoia recomendados a ele serão determinados pelo médico, de acordo com a gravidade da luxação, a idade do paciente e sua assiduidade na prática de atividade física. Exames subsidiários, como a ressonância nuclear magnética (RNM) podem ser necessários para avaliar lesões associadas.

Quando é indicado o tratamento não operatório ou conservador para luxação do ombro?

Em pacientes de menor demanda, de maior idade ou em casos de menor gravidade, o tratamento inicial será baseado no uso da tipoia e no uso de analgésicos e anti-inflamatórios, seguido pela adequada reabilitação. Àqueles que apresentam grande frouxidão ligamentar sem lesão do lábio ou ligamentos, o tratamento não operatório é o mais indicado e a reabilitação deve ter um período mais longo.

Como é a reabilitação ou fisioterapia do ombro para a luxação do ombro?

A reabilitação, realizada tradicionalmente através de fisioterapia, tem diversos objetivos. O paciente deve ser orientado a evitar posições de risco para novas luxações. Gelo pode ser aplicado para diminuir o processo inflamatório. Inicialmente, o tratamento foca na recuperação da mobilidade do ombro. Em seguida, deve centralizar no fortalecimento muscular, com especial atenção aos músculos que formam os tendões do manguito rotador e aos músculos estabilizadores da escápula. A reabilitação pode ser necessária durante um ou dois meses. Depois dessa fase, o indivíduo precisa continuar o fortalecimento muscular – com um treinamento domiciliar ou em academia, mas sempre com muita atenção para evitar movimentos que podem causar a luxação ou sub-luxação. Esse tratamento pode auxiliar na estabilização do ombro em muitos casos.

Quando é indicado o tratamento cirúrgico?

Indivíduos com maior risco de luxação (jovens, esportistas ou com demanda elevada) podem precisar de tratamento cirúrgico após o primeiro episódio da luxação. Nos indivíduos que possuem lesões do lábio, lesões ósseas associadas, lesões dos tendões do manguito rotador ou em indivíduos com alta demanda – como, por exemplo, atleta de esportes de arremesso – o tratamento cirúrgico pode ser indicado. A cirurgia também é recomendável àqueles que sofrem casos recorrentes de luxação ou sub-luxação, sem melhora com o tratamento conservador. Existem diversos estudos avaliando a vantagem e o risco x benefício da cirurgia após o primeiro episódio de luxação. A conclusão final é de que é vantajoso partir para a cirurgia mesmo após um único episódio de luxação.

Como é o tratamento cirúrgico da luxação do ombro?

Existem diversos tipos de cirurgia para o tratamento da luxação recidivante de ombro. Citaremos os dois tipos de cirurgia mais comumente realizados na atualidade. Para a maioria dos casos, o tratamento pode ser realizado por via artroscópica, com 3 ou 4 orifícios de 1cm no ombro e o uso de equipamentos específicos para um procedimento pouco invasivo. Nesse procedimento, é realizado o reparo do lábio (tecido avulsionado ou mal cicatrizado após as luxações) e a capsuloplastia (retensionamento da cápsula articular e dos ligamentos glenoumerais), através de âncoras (pequenos parafusos absorvíveis que são presos ao osso de um lado e tem fios de sutura no outro lado). Com a reinserção, é possível a cicatrização dos ligamentos e do labrum em uma boa posição, apresentando um alto índice de sucesso.

Em indivíduos com consideráveis lesões ósseas da glenóide (acima de 25%), o tratamento através do reparo labral por artroscopia não apresenta uma taxa de sucesso satisfatória, falhando em até 60% dos casos. Nesses casos, é mais recomendada a cirurgia que chamamos de bloqueio ósseo. Em um dos bloqueios mais eficazes e seguros, conhecido como cirurgia de Bristow ou de Latarjet, o osso chamado de coracóide, localizado próximo à articulação do ombro, é movido e fixado na borda da glenóide (local em que houve lesão óssea), aumentando a área óssea e tensionando de modo dinâmico um dos músculos do manguito rotador. É uma cirurgia realizada com maior frequência em países onde são disputados esportes competitivos de alto impacto no ombro, como na França por causa do rugby. O procedimento apresenta alto índice de sucesso, mas ainda é realizada por via aberta – com incisões na pele de 5 a 8 cm. Existem estudos para sua realização por artroscopia, mas o método ainda não é seguro o bastante para ser realizado de rotina. Há ainda outros métodos que podem ser realizados para o tratamento da luxação recidivante, tais como o procedimento de Remplissage – para lesões ósseas da cabeça do úmero -, a capsuloplastia, recomendada para instabilidade multidirecional aos pacientes com frouxidão ligamentar, ou a fixação de fraturas associadas com âncoras ou parafusos.

Fonte: Dr. Mauro Gracitelli